Zequinha ainda não fala.
Mas fala com os olhos.
Com as mãos também. Mãos pequenas que querem tocar tudo, explorar cada textura, abrir cada gaveta, virar cada copo — às vezes com água dentro mesmo. E voa pela casa com seu andador, num ritmo que ganhou até apelido: Seninha, em homenagem ao piloto que, como ele, tinha pressa de viver.
Às vezes fico só observando. Ele passa zunindo, para de repente ao ver uma folha no chão, uma tomada, uma cortina que balança. O mundo inteiro parece novo — porque é. E ele quer tudo. Tudo é mistério. Tudo é aventura.
Nesses momentos, vejo a curiosidade dele pulsando. Viva. Solta. Instintiva.
E aí lembro de mim.
Lembro que também sou assim. Sempre fui curioso. Mas diferente dele, aprendi — ou melhor, me ensinaram — a segurar esse impulso. A canalizar. A “focar”. A crescer. A obedecer.
A escola foi apertando esse botão. Aos poucos. “Presta atenção.” “Senta direito.” “Essa pergunta não é pra agora.”
Não foi por mal. Mas foi o que foi.
E mesmo me considerando uma pessoa criativa, sei que precisei esconder partes da minha curiosidade pra caber no mundo. Como se criatividade só valesse quando dá resultado.
Hoje, vejo no Zequinha uma chance de reconectar com essa versão mais pura de mim mesmo.
Ele ainda não fala, mas me ensina todo dia.
Me lembra que tocar as coisas é tão importante quanto entender. Que observar, sem julgar, é um ato de inteligência. Que a curiosidade não precisa de permissão.
E eu só penso em estar por perto. Não pra podar. Mas pra proteger.
Pra incentivar.
Pra, quem sabe, ajudar o Zequinha a crescer sem deixar de ser curioso.
Porque o mundo já tem rigor demais. O que ele vai mesmo precisar… é de asas.